Luís António Cardoso da Fonseca Mail: luiscardosofonseca@hotmail.com

quinta-feira, 3 de maio de 2007

As casas de Portugal

" As canalizações eram um caso à parte. Ao que parece, aqui pouco mudara através dos séculos, pois a água suja continuava mais ou menos a seguir o incontornável trajecto da gravidade. Infelizmente, muitas coisas conspiravam para obstruir as forças da natureza, muitas das quais cheiravam mal e à luz do dia ainda eram piores. Por mais que considerasse como minha missão mantê-las no subsolo, fora do alcance da vista, por vezes insistiam em abalar a harmonia e o equilíbrio dos Pintainhos e em subir à superfície. Escolhiam sempre a via da menor resistência, que, infelizmente, era a sanita, no rés-do-chão, ou o lavatório, ao pé desta.
Aqui, em Portugal, o principal problema das canalizações consistia em que havia dois tipos de águas residuais. Primeiro, a água residual propriamente dita, ou seja, a água suja proveniente de outras fontes, que não a sanita. Sendo esta água erroneamente considerada inofensiva, eram tomadas medidas sofisticadas para assegurar que não escorresse para os sistemas sépticos privados, mas sim para a via pública. A teoria consistia em que, sendo inofensiva, o seu despejo nas ruas de paralelepípedos não provocaria danos e contribuiria para os lavar e deixar brilhantes. Inicialmente, tentei argumentar que isso não era verdade. A água também transportava resíduos que se acumulavam nas juntas dos paralelepípedos. Além disso, as infecções virais propagar-se-iam mais facilmente, pois a água leitosa atravessava a aldeia à procura de terreno plano. Para não falar dos detergentes em suspensão, que deixavam uma película sobre os paralelepípedos, tornando-os escorregadios. No final, já estavam fartos de mim. Os aldeões sacudiam os ombros e diziam que nada havia a fazer. Era tradição e já era assim há séculos. "

Excerto de " Regresso à casa em Portugal ", de Richard Hewitt, Trd. Cláudia Muller-Porto, Ed. Gradiva

" De um momento para o outro, passou a haver casa a mais. Mas constituirão estas casa um verdadeiro património-valores e capitais para serem transmitidos entre gerações? "

Excerto de artigo de Rui Ramos, com o titulo " Casas de Portugal ", publicado na revista Atlântico de Maio de 2007.

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