Luís António Cardoso da Fonseca Mail: luiscardosofonseca@hotmail.com

terça-feira, 30 de setembro de 2008

As nossas acções não bastam para definir o nosso destino*

«Todos os anos, o mundo indigna-se com o Nobel da Literatura. Motivo? Philip Roth. Será possível que o mais brilhante escritor americano de hoje não ganhe o prémio? A pergunta é absurda por dois motivos. Primeiro, porque existem listas infindáveis de escritores maiores que falharam o Nobel (Joyce, Nabokov, Borges, etc.). E, segundo, porque o Nobel premeia escritores humanistas, ou seja, optimistas, que oferecem à Academia Sueca uma visão inspiradora, e muitas vezes sentimental, da natureza humana.

Roth é o avesso disto e o último livro, Indignation, acabado de sair por estas bandas, é talvez o exemplo mais radical do pessimismo de Roth. Em Indignation, encontramos Marcus Messner, estudante universitário que abandona a família em Newark para fugir de duas condenações: o talho do pai, onde se preparam carnes kosher, e a paranóia do mesmo, que começa a alimentar um medo irracional e mórbido com a segurança do filho. Um pequeno erro pode precipitar consequências catastróficas, diz esta Cassandra judia, que assim reproduz a definição clássica de tragédia. Fatalmente, a tragédia abate-se sobre o filho, que nos relata a sua vida, ou o fim dela, do outro lado da eternidade.

Memórias póstumas, como diria o outro, que apenas sublinham a tensão fundamental da obra de Roth: as nossas acções não bastam para definir o nosso destino; o imponderável intromete-se na nossa conduta, subvertendo muitas vezes as intenções primevas. Isso é particularmente pungente no caso de Marcus, apostado em conseguir o primeiro diploma da família e em escapar a um destino funesto; mas subitamente destruído por vontades alheias e erros menores. Indignation é o relato desse fim sangrento. Um fim só comparável ao dos animais no matadouro.»* Crónica publicada no Expresso Online de 29/09/2008, ler aqui na integra.

João Pereira Coutinho

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