Luís António Cardoso da Fonseca Mail: luiscardosofonseca@hotmail.com

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

" Independança " - GNR

" Eis que aterro sobre a data da gravação deste LP. Ouvi pré-misturas, ideias, convivi com problemáticas teóricas de conciliação do que se pretende com o que pode ser feito aqui em Portugal. Discuti. Abri a minha consciência para o GNR. Escutei o Miguel Megre numa inabitual revelação de teclados e absorvi a sua silenciosa sensibilidade. Enfrentei a solidão irónica mas não menos brutal e exacta do Toli e topei um Alexandre Soares sensual, noutra onda, mas sabedor que ele havia criado o GNR: um grupo famoso do rock português, por dois ou três êxitos de malabarismo artístico e melodias persuasivamente comerciais. Porém apercebi-me da nova dimensão do grupo: presenciava a rotura entre o que fora rock imitador e o que poderia ser rock autónomo no domínio da concepção e da curtição, se bem que servo da tecnologia do rock internacional mais avançado. A ideologia da New Wave dominava o conjunto. O GNR avançou com as suas forças de choque: ousou este LP com uma composição de 27 m num só lado do disco, metronomicamente hipnótica, ilustrada de citações do mais up to date Marquis de Sade ou Talking Eno Heads, ambiciosamente jogando com poesia experimental, live in studio, improvisando na cold wave, teoricamente afirmando saber que Berio existe e abominando o "rock português" no sentido em que qualquer revolução clama contra os valores dominantes. E o Ricardo Camacho foi um bom co-produtor porque nada proibiu. O Vitor revelou-se-me como o grande músico português do rock, como Sarbib é no Jazz ou Emanuel Nunes é na música erudita. Com o seu lugar-tenente Miguel, inventor de invenções melódico-tímbricas, e o seu corpo de ataque de Toli, exímio monomaníaco da tarola, batera-pop, parceiro indispensável para os esquemas robóticos da rítmica exigente do rock contemporâneo. Do Reininho eu era íntimo da sua raríssima cultura de poesia e rock vanguardistas e sabia-lhe da habilidade audio-teatral para a música mas a sua persona vocal, neste LP, surpreendeu-me pelo trémolos ferry-arabizantes, as modulações aleatórias e a capacidade de poder cantar com o GNR, o grupo do momento. Nesta faixa infinita o Vitor foi freetless, frippless, frithless, Artista de Rock.
No lado I procura-se demonstrar um domínio sobre os padrões mais exóticos da new wave dividido em temas que vão dos arranjos de Japan, até ao piano acústico de Corea; colagens sniffantes de pop art; coca-sounds; feed-backs; dissonoes-tupefacto nas actividades digitais; - se algum momento é fraco neste oceano de energia libidinal ele é rotulado por uma pseudo-crítica como "rock português" - mas compreende-se, o disco é feito inteiramente por portugueses.

Electro-scats, multi-ressonâncias, misturas devolucionais, escato-poemas, remoto-melodias, galactico-imitações, lúdico-virtuosismos de baixo, sincronias metamáticas da percussão, passas de strings, etc... cibernantropicamente concluindo: " Independança" é a obra de rock feita em Portugal com maior qualidade e vanguardismo, e o GNR é a mais promissora instituição sonora para produzir rock nas ecologias artificiais da nossa imaginação. "

Jorge Lima Barreto

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