Luís António Cardoso da Fonseca Mail: luiscardosofonseca@hotmail.com

segunda-feira, 23 de julho de 2007

O terramoto ignorado

Ser europeu não deveria ser viajar sem passaporte, comprar roupas de marca ou reclamar subsídios. Ser europeu é - ou deveria ser - a busca da solidariedade e o sentimento da cultura. Seria sofrer, neste instante, pelas consequências do terramoto que abalou a Úmbria e as Marche, duas províncias da Itália do meio, aquela Itália que não perdeu a cabeça com o dinheiro nem com a displicência e, sendo belíssima, continuou gentil.
Um terramoto que só fez dez mortos e três centenas de feridos - tanto quanto um desastre de comboio - , mas que arrasou, por completo, muitas pequenas aldeias e golpeou, em Assis, terra de São Francisco, o ciclo giottesco, uma das maiores inspirações da arte italiana, da arte europeia, da arte de todos os povos - a perfeição de uma humanidade e de um estilo.
Um europeu sentiria dor física ao ver o que o terramoto impiedoso fez no coração da Itália e da Europa e muito medo pelas perdas que o entulho e os destroços ainda possam esconder.
Duvidamos que os portugueses tenham recebido essa perda dessa forma. Ou de qualquer outra. Havia os senhores Damásio e Manuel José além dos campanários habituais.
Mas não fomos só nós. A comunicação social inglesa preocupou-se muito mais com a condenação ( remível a dinheiro ) de uma inglesa na Arábia Saudita, a francesa com a visita de Chirac a Moscovo, a espanhola com a Liga e a bolsa. E a própria Igreja italiana parece ter dado mais importância ao Congresso Eucarístico e ao festival com Bob Dylan.

Crónica de Victor Cunha Rego, para o DN e incluída em " Os dias de amanhã ", Ed. Circulo de Leitores, 1999.

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